Uma das grandes leituras deste ano: Filhos da Chuva!
Primeiro, uma confissão.
A leitura inicial deste livro não me cativou. Achei que as partes iniciais talvez precisassem de uma escrita mais limpa e ligeira, o que não significaria tirar-lhe valor. Quem está habituado a ler Afonso Cruz, Valter Hugo Mãe e companhia, sabe bem do que falo. Ainda sobre isso, não invejo o trabalho que deve ter sido essa tarefa de nos apresentar a complexidade de Domínio assim logo de repente e em poucos capítulos.
Esta leitura foi uma sugestão da minha amiga Sandra Barbosa, do programa Páginas Soltas. Apenas me disse: "Tens de ler o Filhos da Chuva de Álvaro Curia. Vais adorar". E ela conhece-me e aos meus hábitos de leitura tão bem, que a sua vaga mensagem foi suficiente para me fazer continuar. Sabia que, depois desta sugestão, algo haveria ali para mim. De resto, já seguia a página de Instagram há anos e a existência desta obra não me era estranha.
Foi por volta da página 60 e no capítulo 6, se não estou em erro, que este livro se transformou aos meus olhos. Foi nesse contar da relação meio trágica meio possessiva de Mãe e Filho que me vi obrigado a fazer uma pausa e deixar-me ficar só no sofá a processar a leitura. Sem que o esperasse, estava já submerso nas águas deste livro.
A partir daí foi uma sucessão de textos de uma sensibilidade, beleza e brutalidade incríveis. José Luís Peixoto diz na capa de Filhos da Chuva: "Há vida aqui". E eu digo: Há talento aqui. Um talento e técnica que poucos têm. Há mestria e há alguém que lê muito, condição que sempre disse ser essencial a quem quer escrever.
Fala-se muito de ler os nossos, os autores nacionais, os portugueses, mas não se fala o suficiente do elogio que raramente é feito. Não se fala de quanto nos acanhamos em elogiar só porque é nosso e porque pode parecer exagerado lisonjeio.
Que este seja feito sem amarras, quando merecido.
E foi por isso que precisei de me sentar e escrever realmente sobre o que acabei de ler. Há passagens e personagens que levarei comigo o resto da vida. Há o Filipe menino estranho (queer), filho, amor, que se encontrou nestas páginas sem nunca o esperar (e agradeço por ter sido mantido esse mistério ou por eu nunca ter lido sobre ele antes de pegar no livro).
E há um nome, Álvaro Curia, que me fará querer ler qualquer livro seu.
Conseguir isso com um primeiro livro é obra.