Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

O blog do Fi

um português em Berlim

O blog do Fi

um português em Berlim

Primeira entrevista sobre o "Entre as Mulheres"

Filipe B., 19.10.23

capa do livro Entre as Mulheres, mãe segura filho pela mão

Aqui está a primeira entrevista onde falo do novo livro.

Foi uma conversa muito interessante sobre o estigma do autismo, o meu Serviço Voluntário Europeu em Itália, a inspiração para os personagens e a dicotomia campo/cidade que criei nesta história.

"Durante o meu projecto de voluntariado, o que mais me custou foi ver que algumas crianças eram, muitas vezes, rejeitadas pelos colegas e até pela própria família só porque eram… diferentes. Quero mostrar com este livro que as nossas diferenças podem ser a base da nossa união..."

Podem ler tudo no blog da editora Intelectual aqui

Serviço Voluntário em Itália: como é trabalhar com as crianças?

Filipe B., 17.03.16
No Centro Educativo não fazemos só os trabalhos de casa, também pintamos, jogamos, inventamos...

Mesmo antes de eu vir para aqui, a minha mãe disse-me assim: "Ó filho... tenta não te apegar demasiado às crianças com que vais trabalhar porque depois vai custar-te mais quando tiveres de vir embora". 

Bem... tarde demais. E a mãe, quando me disse aquilo, também já sabia que era impossível isso não acontecer. Afinal, ela conhece-me melhor do que ninguém.

E, ao fim de 5 meses neste projecto de voluntariado europeu, a verdade é que já tenho uma ligação muito, muito grande a alguns dos miúdos com quem trabalho todos os dias. 

E digo alguns, pois são muitos (em alguns dias passam os 40) e claro que acabo por estar mais tempo com uns do que com outros.

Mas como é afinal estar a apoiar estas crianças todos os dias?

Resumindo já: é brutal, brutal, brutal!

Falar com eles tornou-se, com o tempo, muito fácil. Dominar o italiano tem sido uma grande mais valia na nossa comunicação e por isso mesmo já consegui criar uma relação muito gira com os bambini.

Eu já sei do que eles gostam, que filmes preferem, que jogo lhes rouba o tempo em que deviam estar a estudar (ahah!!), etc, etc.

Ser voluntário, com e para eles, tem sido por isso uma aprendizagem diária

Tenho já comigo momentos inesquecíveis, que vou guardar bem dentro do meu coração, como um dia em que cheguei ao trabalho e um deles veio e disse com um grande sorriso:

"Lembras-te da matéria de francês que me ajudaste a estudar para o teste? Tive muito bom".

A sensação de conquista que se tem ao ouvir uma coisa destas é tremenda, mesmo daquelas coisas fortes que te fazem feliz subitamente

E a grande verdade é que eu não me lembro de algum dia ter-me sentido feliz por ir trabalhar, como sinto quando vou entrar neste Centro Educativo, e só isso será suficiente para justificar o quanto eu estou a gostar desta experiência.

E... é inevitável, fatal como o destino, não pensar que este projecto de facto tem um fim. Dura 10 meses. Já fiz 5. Estou a meio. E estou a fazer tudo, tudo, tudo, para o aproveitar ao máximo. 

Todos os dias tento guardar as minhas energias todas para aqueles miúdos e para as horas que passo com eles. É cansativo, por vezes são irrequietos, difíceis, complicados como qualquer criança, mas no fim das contas o resultado é sempre muito, mas mesmo muito positivo

Eu não podia ter tido um Projecto de voluntário melhor do que este. Não tenho qualquer dúvida. 

Serviço Voluntário em Itália - o meu propósito

Filipe B., 03.03.16



Hoje venho contar-vos algo tão simples como o diálogo que tive com um dos bambini (crianças) nesta tarde de trabalho no Centro Educativo onde sou voluntário.

Estávamos a fazer os compiti (trabalhos de casa) e ele escreve uma frase sobre o seu gato. Digo eu:

"Também tenho um gato."
E pergunta ele: "Aqui em Itália?"
"Não. Em Portugal."
"Então e ele está lá sozinho?" 
"Não está sozinho. Está com a minha avó, os meus pais e a minha irmã".
"Então e não sentes a falta deles?" (a palavra saudade não existe em italiano)
"Claro que sinto. Mas agora tenho que estar aqui para te obrigar a fazer os compiti."

Rimos os dois.  

"Tu depois voltas para Portugal ou ficas aqui?"
"Volto."
"Então tens que prometer uma coisa."
"O quê?"
"Quando estiveres em Portugal fazes uma chamada de vídeo aqui para o Centro e mostras-me o teu gato no computador."

Como não amar? COMO? :') :') :') 

Só consegui sorrir e prosseguir com a nossa tarefa. Mas com uma motivação extra.

Todos os dias há algo assim, algo especial que se diz ou faz. E são estes momentos que me dão um propósito para aqui estar. O propósito. 

Serviço Voluntário: o bloco de notas

Filipe B., 23.02.16
Anda sempre comigo. 

Escrevi este texto no bloco de notas há cerca de 4 meses. São as primeiras palavras que publico daquilo que tenho escrito neste meu fiel companheiro. E talvez as únicas. 


"5/11/2015 - Forlì - 13:48h

Já estou há um mês em Itália. Na verdade completa-se exactamente um mês só daqui a dois dias... mas que são afinal os dias no calendário? Se já parece que estou aqui há bem mais tempo...
Esta coisa da passagem do tempo é mesmo muito relativa.
Agora já tenho mesmo a sensação de estar mesmo a viver aqui. Não estou em visita. 
Há um mês deixei para trás tudo o que era meu. Trouxe comigo a roupa, alguns objectos como recordação. Trouxe-me a mim. Mas os amigos ficaram. A família também. Os meus livros, os meus jogos, o meu quarto. 
E aqui comecei do zero.
Se há momentos em que sinto uma infinita solidão por necessidades tão básicas como a de querer falar a minha língua-mãe e não poder; também há outros (e muito mais intensos!) em que sinto que todos os dias isto é uma conquista. Todos os dias, sem escapar nenhum, há sempre algo inesperado. E se todos os dias sinto saudade, também me sinto um guerreiro, em luta para construir um novo eu que está em evolução constante a cada passo que aqui dá."