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O blog do Fi

um português em Berlim

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Está aí alguém?

Filipe B., 07.04.21

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Nas últimas semanas vi o "Dancing with the Devil" (Dançando com o Diabo), documentário dividido em 4 episódios sobre a overdose quase fatal e a posterior recuperação da cantora Demi Lovato. 

Podia escrever um blog inteiro sobre como adoro a voz da Demi, mas na verdade esse documentário podia ter qualquer um ali, podia ser qualquer um de nós no seu lugar a contar aquela história. E essa é a sua maior força. E é aí que me quero focar. 

Sem grandes rodeios, o documentário (disponível no Youtube) aborda temas muito pesados, como a dependência de drogas e alcóol, depressão e comportamentos autodestrutivos. E há mais, muito mais, mas não quero estragar algumas revelações. 

Já muito falei de saúde mental aqui no blog, por exemplo no meu post sobre um ataque de pânico. E mesmo assim, sinto que nunca falo o suficiente. 

E este documentário e algo que a Demi diz, fez-me pensar tanto sobre as ideias erradas que ainda pairam sobre este assunto. 

Não é segredo e é aliás com muito orgulho que o digo. Desde o ano passado que voltei a fazer psicoterapia.

2020 foi o ano que todos sabemos, mas pelo menos deu-me/deu-nos tempo para olhar bem cá para dentro e perceber as caixas e gavetas que precisavam de ser arrumadas. 

Mas ao fim de quase 7 meses de psicoterapia (mesmo já tendo falado bastante disso) ainda há pessoas que se assustam quando falo abertamente disso. Normalmente causo sempre pânico quando falo disso. "Mas estás bem?" - é a pergunta recorrente, e eu entendo. Não é fácil falar sobre isto. É óbvio que não estava bem, se procurei ajuda, mas não estaria eu pior se não o tivesse feito?  E eu sei, o meu passado e bagagem que carrego podem causar alarme, mas não deviam ficar mais preocupados se eu não falasse disto? 

É tão difícil lutar contra isto, esse estigma, essa ideia de que estamos no fim dos nossos dias se por acaso falamos disto ou sequer decidimos procurar ajuda médica.

Ora, se tenho uma dor no braço, vou a um médico. Se o meu estômago não anda bem, procuro um profissional. Por que razão não é tão simples ter o mesmo pensamento no caso da psicologia? Se a nossa mente não anda bem, se queremos resolver um trauma, um medo, um distúrbio qualquer, não é normal que se procure um profissional que estudou e se preparou exactamente para isso?

Simples, parece simples.

Na música que dá nome ao documentário, a mesma em que confessa a recaída para as drogas e álcool, ela canta "Eu disse-te que estava bem, mas menti". E é exactamente isso que precisamos de combater, evitando fechar as portas a este assunto e, fazendo o contrário, criar abertura para que alguém nos diga "não estou bem", "preciso de ajuda", o que for. Chega de ter que mentir e esconder sobre problemas que deviam ser tratados como outros problemas quaisquer. 

Uma coisa vos digo. O Filipe que entrou há 7 meses naquela sala de terapia não é o mesmo Filipe que vos escreve  agora. É como se me tivessem dado um par de óculos mágicos e agora vi-se tudo de outra maneira (não se enganem, às vezes é uma maneira mais crua de ver, mas necessária, oh, tão necessária!). E eu sozinho não conseguiria aqui chegar. Isto vos confesso.

Ver este documentário foi ver-me ali muitas vezes, embora os meus dilemas sejam outros, não relacionados com esse tipo de recaída. E sei que tantos de nós vão encontrar nas suas palavras as nossas palavras. 

Espero que sirva para abrir ainda mais a simplicidade, ainda que dolorosa, com que se fala (ou devia falar) sobre estes assuntos. 

Na canção Anyone, Demi pergunta: "Is there anyone?" (está aí alguém?). 

É um refrão pesado, um grito de ajuda, um pedido de socorro. E entende-se bem porquê. Não há maior frustração do que sentir isso, que ninguém ouve, que não está ninguém do outro lado, que não há... salvação.

Sejamos então esse alguém que ouve e compreende. Sejamos esse alguém online, nas nossas vidas privadas, no nosso grupo de amigos, na nossa família. 

Não posso dar muitos conselhos. Mas deixo um. Quando aí dentro, bem lá no fundo, essa voz gritar por alguém, procurem ajuda, sempre. E se a ajuda falhar, procurem-na outra vez. E outra vez, até que um dia possam ser vocês, quem sabe, o suporte de alguém. 

 

 

 

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